As traições e reviravoltas de “Slashdance”, 3º episódio de “1984”

Apesar do título “Slashdance”, o último episódio exibido de ‘1984’ não tem nenhuma dança e nenhuma referência ao filme Flashdance. O que há para o público em Slashdance, então? Muitos flashbacks e personagens fugindo em pânico. Sendo franco, considero este o melhor episódio até o momento, numa temporada que tem se mantido cautelosamente consistente em sua proposta inicial.  

A trama continua focando ainda na mesma noite, onde acompanhamos o grupo de tutores que se dividiu em dois no episódio anterior. Um grupo está sendo perseguido por Richard Ramírez (Zach Villa), e o outro, por Sr. Jingles (John Carroll Lynch). A perseguição por parte do Night Stalker nos gera uma dúvida: Margaret (Leslie Grossman) não havia acabado de lhe “contratar” para proteger o acampamento da ameaça de Sr. Jingles?

O que parecia um erro de roteiro na semana passada, agora foi justificado. Rita (Angelica Ross) havia lutado contra o psicopata fugitivo de manicômio e saiu com apenas um arranhão, enquanto Sr. Jingles já provou ser eficiente e bastante rápido no que diz respeito a cortar gargantas e decepar orelhas – e cabeças. Rita sair quase ilesa do encontro era no mínimo estranho. A personagem, que na verdade se chama Donna Chambers, ser revelada como uma psiquiatra de péssimo caráter foi uma das melhores reviravoltas desta semana, mas o impacto foi um pouco diminuído por conta de seus motivos um tanto incoerentes.

Donna estudou serial killers no passado e almeja desvendar o mistério que é Benjamin Richter. Uma semana antes do acampamento ser aberto, Donna consegue agendar uma visita a Benjamin, e então conversam sobre a natureza do mal e como ela acredita mais em circunstâncias que levam alguém a cometer algo ruim, do que a pessoa seja de fato simplesmente má. Sr. Jingles quer desesperadamente acreditar naquela ideia, primeiro ponto do episódio que nos mostra um pouco de humanidade no assassino.

Jingles pode ser aquele que está esfaqueando e decepando orelhas no acampamento, mas em inúmeras maneiras, Donna carrega bem mais culpa nisso. É visível que ele não quer retornar ao acampamento para que o seu ‘desvio de conduta’ não seja engatilhado, e ainda assim a doutora o induz a vestir sua capa e armar-se com uma faca novamente, dizendo a ele que qualquer fatalidade que acontecerá servirá a um motivo maior. Fica claro que na jornada de Donna em entender serial killers, ela termina alimentando suas ilusões e os dá desculpas convenientes para o porquê deles serem como são. Entretanto, Richard Ramírez é uma peça no tabuleiro de xadrez que Donna não esperava, e provavelmente irá arruinar o andamento de seu experimento.

Já o flashback de Ray (DeRon Horton) não se mostrou tão interessante quanto o de Donna, mas nos revela o motivo do rapaz querer tanto passar o verão no Acampamento Redwood: numa festa da fraternidade estudantil que participava, o jovem tutor tentou demonstrar apoio a um dos novatos que estava bêbado e acidentalmente o mata, deixando o rapaz cair num lance de escadas. Para encobrir o ocorrido, Ray tenta simular um acidente de carro com o novato.

Sabemos que em obras de horror, encobrir assassinatos com um acidente montado quase nunca dá certo, e aqui não seria mais uma exceção: o rapaz não estava morto, e acordou quando o carro estava descendo rumo a um precipício. Mas já era tarde, Ray não conseguiu parar o carro e o novato ainda puxou seu relógio no momento. Seria uma questão de tempo até a polícia conseguir localizar o dono do relógio.

Desde o início dos acontecimentos macabros no acampamento, percebemos que Ray não é a pessoa mais corajosa do grupo de tutores e continua a agir de maneira covarde sempre que pode. Ele só contou a Chet (Gus Kenworty) sobre a história do “acidente” na fraternidade pois pensava que o colega tutor iria morrer, os dois haviam caído numa armadilha de Sr. Jingles e Chet estava preso. Ray termina abandonando-o para morrer, e faz o mesmo com Montana após reunir-se com ela. Seu destino, entretanto, foi o machado de Sr. Jingles.

Todos estes flashbacks nos trazem mais evidência de que todos reunidos no acampamento possuem uma grande bagagem da qual estão tentando fugir ou alcançar. É uma questão de tempo até que todas estas bagagens entrem em conflito, o que nos leva a Montana (Billie Lourd), nossa segunda reviravolta da semana. A entusiasta de aeróbica possui um relacionamento secreto com o Night Stalker e possui Brooke como alvo (ou quem quer que ela esteja se referindo).

Slashdance termina por ser bem um episódio bem sucedido por revelar as intenções de Donna e Montana mais cedo na temporada, ao invés de segurar estas reviravoltas por mais episódios. ‘1984’ continua a brincar com as tradições dos filmes slasher e não perde tempo ao nos trazer cenas com pessoas empaladas ou decapitadas, e, mesmo que ainda não tenhamos a certeza de onde Ryan Murphy e sua equipe quer nos levar com esta trama e personagens nos próximos episódios, esperamos que as reviravoltas sejam executadas com a mesma qualidade que foram nesta semana.

POST SCRIPTUM 1: Margaret e Chefe Bertie (Tara Karsian) estão misteriosamente ausentes neste episódio. Como se explica o sumiço das duas durante todas as perseguições, movimentação de carros e motos, e pessoas sendo mortas no acampamento?

POST SCRIPTUM 2: Curiosamente, o segundo momento onde vimos mais sinais de humanidade em Benjamin Richter foi quando o mesmo poupou um adolescente fantasiado de Sr. Jingles. Parece que ele e Cara Sangrenta (Bloody Face) são assassinos tão famosos no universo de American Horror Story ao ponto de pessoas reproduzirem suas máscaras (ou rostos) e jovens festejarem seus crimes. Em Murder House também tivemos um momento parecido, onde pessoas tentarem reproduzir os assassinatos que ocorreram na casa quando o local era uma república de estudantes.

Por Gabriel Fernandes em 08 de October de 2019

"Tu fui, ego eris". Arquiteto e urbanista, ilustrador independente, colecionador de mangás e grande apreciador do gênero terror em filmes, séries e jogos.