Os avanços temporais de “Episode 100”, 6º episódio de “1984”

Através de nove temporadas, American Horror Story se reinventou inúmeras vezes até alcançar a marca de 100 episódios exibidos, e este fato poderia facilmente ser o foco deste episódio de alguma forma. Foi exatamente o que Ryan Murphy fez quando Nip/Tuck atingiu a marca, que foi o último episódio da série, e o mesmo para Glee, onde o 100º foi um grande episódio com vários atores convidados e números musicais memoráveis. Uma grande porção deste capítulo de 1984 fala sobre legado, e de fato, seria apropriado que a marca alcançada fosse abordada na trama, mas Ryan Murphy e Brad Falchuk decidiram trilhar um caminho mais humilde, proporcionando um episódio no mínimo divertido, que mantém o fôlego da temporada.

Depois dos acontecimentos no último episódio, Benjamin (John Carroll Lynch) e Richard (Zach Villa) estão numa série de assassinatos desenfreados por bastante tempo. O Night Stalker parece não se saciar nunca da diversão e energia que sente ao cometer perversidades, enquanto Sr. Jingles começa a demonstrar óbvios sinais de que não está nada fascinado com o novo rumo que sua vida levou, afinal, ele nunca foi de fato um psicopata. Benjamin está preso à esta situação devido um pacto com ninguém menos que Satanás, e se quebrar este pacto, Satanás pode simplesmente retirar a vida que lhe concedeu. É uma situação aparentemente impossível de encontrar uma saída que continua a nos proporcionar pontos de vista que nos fazem sentir empatia pelo personagem.

A prisão de Richard Ramirez chega a ser um momento um tanto cômico. Na vida real, Ramirez havia recentemente retornado a Calfornia após uma tentativa fracassada de encontrar seu irmão em Arizona, e não fazia ideia do quanto sua fama havia aumentado. A ficha só caiu quando notou seu rosto em jornais de uma loja de conveniência, e um grupo de senhoras mexicanas começaram a gritar, chamando-o de “El Matador“. O Night Stalker tentou fugir, pulando cercas e muros e ainda tentou roubar três carros, mas eventualmente um grupo o alcançou e o imobilizou, até que a polícia chegou e o levou em custódia. Ao invés de enfeitar a situação, a série adaptou bem o momento de captura do serial killer à trama já estabelecida. Mas sendo American Horror Story, Ramirez não foi impedido nem mesmo após ser morto, então, por qual motivo estar preso o impediria de continuar sua sina de matanças?

E assim, as férias assassinas de Sr. Jingles e do Night Stalker chegam ao fim. Richard termina sendo preso por seus crimes, e Benjamin encontra paz em Alaska e consegue constituir uma família. Não somente ele tem uma família, mas conseguiu deixar para trás todo o trauma do acampamento Redwood, e tudo está um mar de flores. Todas as cenas onde notamos a mudança de vida bem sucedida torna mais angustiante o momento onde vemos a nova vida de Benjamin ser arrancada dele. Por já termos empatia suficiente com o personagem, a audiência consegue comprar a ideia onde ele se reapropria da persona Sr. Jingles, tornando-o uma espécie anti-herói.

Com um salto temporal de 5 anos, chegamos a 1989! A linha do tempo avançada contribui bastante para o avanço que a temporada precisava, deixando a audiência curiosa para saber o que aconteceu com cada um dos personagens 5 anos após um segundo massacre ter acontecido no acampamento Redwood. E assim, boa parte de “Episode 100” foca em nos atualizar a respeito da vida dos sobreviventes, e também da pós-vida daqueles que ficaram presos no acampamento.

Falando em pós-vida, os espíritos de Montana (Billie Lourd) e Xavier (Cody Fern) tornaram-se um casal… E por que não virariam, certo? Não é uma surpresa ver que Montana entregou-se ao seu lado sombrio por completo, mas chega a ser interessante ver que Xavier também trilhou o mesmo caminho, ao invés de tornar-se um espírito mais consciente como Ray (DeRon Horton). Este, ainda se preocupa com a importância de ser bom, enquanto isso parece ter se perdido em quase todos aqueles que morreram no acampamento. Como comentado anteriormente, é um bom desenvolvimento para o personagem, que torna-o mais fácil para a audiência simpatizar-se.

Margaret (Leslie Grossman) se casou com Trevor (Matthew Morrison) após uma tentativa frustrada de chantagem, e tornou sua trágica história junto da herança de seu falecido marido num verdadeiro império imobiliário, comprando propriedades com passados sombrios e as tornando em atrações turísticas. Neste momento a série nos dá um aviso amigável sobre as ligações entre temporadas, e ficamos sabendo que o antigo sanatório Briarcliff também foi adquirido por Margaret. Assassinatos significam bons negócios para ela, e a morte recente de dois campistas no acampamento Redwood não irá manchar sua reputação. De fato, usando seu carisma, ela se apropria da situação e anuncia que um festival de rock acontecerá em Redwood, com ninguém menos que Billy Idol, artista favorito de Richard Ramirez, como atração principal. Este festival é o gancho que unirá os personagens novamente.

Após recebermos updates a respeito do estado de cada personagem, chegamos a Brooke (Emma Roberts), que acaba de perder seu último recurso judicial e está na fila da pena de morte. Isto deixa Ramirez e Satanás interessados em sua alma, especialmente por ela não ter nada a perder, aparentemente. Chega a ser preocupante perceber que Brooke talvez sucumba à tentação de ceder sua alma, mas ela termina mantendo-se firme. Acredito que a audiência ainda queira que Brooke consiga sua redenção como heroína e não se torne numa assassina que Margaret fez todos acreditarem que ela é, então é animador ver que mesmo nesta situação ela ainda manteve sua força de vontade. E numa incrível sequência entre o renascimento de Sr. Jingles e a aplicação da injeção letal em Brooke, ao som de The Smiths, quando pensamos que havíamos visto o último suspiro da verdadeira final girl… Supresa, vadia: é revelado que Donna (Angelica Ross) havia lhe salvado da morte e ali nasce uma ligação um tanto improvável.

Episode 100” é um episódio que mantém o público entretido e curioso para saber o que aconteceu neste salto de cinco anos, e começa a mover os personagens para o arco final da temporada. Há quem talvez tenha se desapontado por conta do ritmo deste episódio ter sido mais brando que o do anterior e por ser o 100º episódio da série, mas é bom saber que a trama ainda mantém seu foco. 1984 finalmente nos dá uma boa ideia de como será o seu final.

POST SCRIPTUM: Quem sabe ao final da temporada, Brooke chegue ao ponto onde poderia disputar quem mais conseguiu despistar a morte com Madison Montgomery.

Por Gabriel Fernandes em 29 de October de 2019

"Tu fui, ego eris". Arquiteto e urbanista, ilustrador independente, colecionador de mangás e grande apreciador do gênero terror em filmes, séries e jogos.